Descrédito e ‘clientelismo’ provocam 2º turno nas eleições da Paraíba desde 2002, avalia historiador

29/04/2018 - 08:34 - Política

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Descrédito e ‘clientelismo’ provocam 2º turno nas eleições da Paraíba desde 2002, avalia historiador

A construção política na Paraíba é um museu de poucas novidades. A afirmativa está baseada na análise realizada pelo professor doutor em História Política da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Lúcio Flávio Vasconcelos. O chamado clientelismo, dessa vez midiático, vem sendo explorado pelos que ocupam cargos eletivos, utilizando as mídias sociais para divulgar suas ações com um propósito primordial: criar ou manter seu “curral eleitoral” adotando meias verdades no discurso empregado.

Nessa lógica, as quatro famílias com maior influência política na Paraíba elencadas pelo professor, Maranhão, Vital do Rêgo, Cunha Lima e Ribeiro, não fogem à regra, utilizando a velha fórmula advinda do coronelismo do “toma lá, dá cá”, a fim de manter-se no poder. Outros políticos com traços inclinados à direita ou esquerda, aponta Lúcio Flávio, também utilizam do expediente.

Os políticos apresentam fórmulas de campanha que podem beneficiar a população de forma macro. No entanto, o real objetivo é conquistar o aparelho do Estado, a fim de obter cargos públicos e garantir a distribuição deles aos seus correligionários, conquistando cabedal eleitoral futuro.  No coronelismo, observou o docente da UFPB, o líder político local retirava do seu bolso dinheiro para praticar “favores”, como a compra de passagens, distribuir óculos e coisas do gênero.

No clientelismo, que ganhou nova roupagem devido à velocidade das informações disseminadas nas redes sociais, os agentes políticos excluem propostas como a solidificação de obras estruturantes em áreas portuárias, aviação e crescimento da indústria, por exemplo, empregando a energia na concessão de empregos públicos, benefícios fiscais e vantagens econômicas. Ou seja: um indivíduo “vende” seu voto ou apoio político em troca de algum tipo de favorecimento pessoal “bancado” pelo Estado.

Estudioso diz que a política na Paraíba é “paroquial” e a bancada federal não tem compromisso com o Estado


Lúcio Flávio é professor doutor em História Política da Universidade Federal da Paraíba

O professor Lúcio Flávio não vê em médio prazo a chance de ser efetivada uma reformulação no “fazer política” na seara estadual. Ele classifica como “paroquial” as disputas dos atores políticos paraibanos, apontando a falta de união da bancada federal do Estado no que diz respeito a pressionar o Governo Federal para trazer obras significativas que beneficiem o povo paraibano, principalmente às geradoras de empregos privados. O docente citou que na gestão do governo Lula, o Nordeste foi beneficiado de maneira macro, ficando a Paraíba fora do contexto, exceto na transposição do São Francisco.

O acadêmico citou, por exemplo, que Pernambuco “abocanhou” nos governos do PT (Lula e Dilma) dois grandes implementos geradores de empregos: a refinaria de Abreu e Lima e a fábrica da Fiat, cravada em Goiana, município pernambucano que faz divisa com a Paraíba. Ele atribuiu diversos problemas que deixaram o povo paraibano carente dos benefícios da “era Lula”, apontando, dentre outros “culpados”, a postura da bancada federal paraibana.

“Os nossos três senadores e doze deputados federais não conseguiram blocar e fazer uma pressão adequada ao Governo Federal. Salvo a transposição do São Francisco. E governo (federal) funciona sobre pressão. Ele não solta obras se não houver pressão, e isso não houve. E estou falando que não houve união da nossa bancada federal seja no governo Maranhão, seja Cássio, seja Ricardo Coutinho”, avaliou.

Nas considerações de Lúcio Flávio, os embates eleitorais nos municípios dos que detêm político são válidos e fazem parte do processo democrático. “As disputas locais são naturais, mas o importante é convergir em opinião para trazer obras para a Paraíba. Obras que beneficiem todos. É claro que o cálculo político é individual no sentido do que pode lhe dar mais votos, mas também cada um tem que pensar no desenvolvimento do Estado. Em algo é maior. Mas a nossa política é atrasada. É provinciana, infelizmente”, lamentou.

Mais à frente o docente analisou a “formatação de pensamento” dos políticos paraibanos em empregar energia na conquista de um cargo eletivo. Segundo ele, a grande maioria assume um discurso progressista mas, quando eleito, o pensamento se desfaz, havendo disputa ferrenha pelos cargos, em um ciclo vicioso difícil de ser anulado. Indagado se há uma solução para a modificação de pensamento, Lúcio Flávio explicou ser muito difícil.

Ele observou que só com uma ação efetiva do Governo Federal na implementação de obras estruturantes, efetiva aplicação de recursos na saúde e educação, bem como incentivos para a implementação de um parque industrial no Estado podem sufocar o clientelismo político.

Descrédito nas propostas dos candidatos e clientelismo vêm provocando segundo turno desde 2002 na Paraíba


Forças políticas vêm se alternando na Paraíba, estando o eleitor diretamente ligado ao contexto

As observações de Lúcio Flávio mostram que, devido ao clientelismo acentuado, desde 2002 nenhum candidato ao Governo do Estado conseguiu sagrar-se eleito no primeiro turno. Esse fenômeno se dá, segundo o docente da UFPB, por um fator simples: não há uma proposta diferenciada dos postulantes, e os eleitores observam esse detalhe.

Além disso, as forças políticas vêm se alternando entre o MDB, PSDB e PSB, estando o eleitor diretamente ligado a esse contexto, pois, em sua maioria, têm vínculos empregatícios no Estado, mesmo que de forma precária, ocupando cargos comissionados ou prestando serviço.

Como parte dessa “ciranda” de alternância do poder, está em jogo não apenas um cargo público, mas estar ou não empregado. “As pessoas matam e morrem pois estamos falando de emprego. A sua feira, o pagamento do colégio das crianças. Isso é muito forte. Essa regra vale desde a merendeira a um secretário de governo. É muito sério tal situação. Após as eleições, no dia primeiro de janeiro, doze mil pessoas perdem seus cargos para serem ocupados com aliados do vencedor”, avaliou.

Como forma de manter seus empregos, as pessoas que ocupam cargos provisórios na máquina administrativa pública passam a ser “ponta de lança” dos políticos. No outro front, os que buscam um “lugar ao sol”, não havendo “trégua” política na Paraíba, uma vez os processos eleitorais acontecem a cada dois anos. “Trata-se de algo provinciano e triste de observar”, constatou Lúcio Flavio.