29/04/2019 - 10:55 - Opinião
A Areia de Pedro Américo
Ontem, visitamos os mil e um castelos de Areia; ainda intactos. Em cada sobrado, coisas de duzentos anos arrumadas no mesmo lugar.
As intervenções necessárias não macularam (de todo) os lugares; em cada cômodo, parecíamos ouvir: cochichos, respirações ofegantes e gritos abafados.
Só não havia música.
Entrávamos sem muito alarde, em respeito ao que se foram primeiro. Os olhares ansiosos passeavam por cada canto, como que procurando os seus inquilinos.
Mas, naquele berço não havia nenhum menino...
Subimos e descemos escadas, num exercício de idas e vindas. Ficamos por alí o tempo suficiente para nos reencontrar com o passado e imaginar algum sentido...
Não dá para seguir adiante, sem compreender o que veio antes de nós.
Contos antepassados, tristes histórias de ninguém; apenas relatos que se sustentam pelo imaginário vigiado.
Eira, beira, tribeira, sobreira...
Na terra de Pedro Américo, tudo é dolorido e colorido.
Os escravos passeiam dos engenhos às senzalas, sob a vigilância dos homens ricos que, à porta dos casarões, recebem os coronéis; sob a benção da igreja e sua inabalável fé, uma cidade inteira toma a forma que bem quiser; e nem os pincéis de um gênio salvaram o Cristo do madeiro...
Coitadinho de mim, "sem eira nem beira"... Mas, tendo que sustentar tudo aquilo. O que faço com a recompensa dos meus dias? Não há como devolver nenhum sorriso...
A cidade de Areia, brejo paraibano, arde em chamas no fim de tarde (e todos os dias são assim). Fugidias, as almas de todos os seus se atribulam por ter que reencarnar papéis no teatro de Minerva.
Misael Nóbrega de Sousa
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